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É uma leitura quase aborrecedora. A história mais parece um "muro das lamentações". A despeito da miserabilidade e desrespeito humano - racial, étnico, religioso, ético, social e político - que os ciganos estão sujeitos em todo o mundo, a autora tenta, ao longo do livro, compará-los aos judeus, como vítimas da humanidade. Se já é difícil a gente agüentar a choradeira dos judeus pelo mundo afora, desde a segunda guerra, como se fossem as grandes vítimas de toda a humanidade, agora vem também os ciganos - pelo menos a autora - e se colocam nas mesmas condições de mártires da humanidade. É demais. O Enterrem-me em Pé, até pode agregar valor à história cigana, enquanto livro-depoimento, mas mesmo assim é muito chato, embora a autora tenha sido muito festejada no Flip de 2005, em Parati, no Rio de Janeiro.
A história das viagens da autora, entre 1991 e 1995 pela Europa Oriental, onde se concentram 8 milhões de ciganos, que vivem em condições de muita miséria.
Ciganos como os delegados em Machern já circulavam por essa rota centenas de anos antes que o nacionalismo étnico fosse sequer articulado na Alemanha; meio milênio atrás, muitos deles haviam feito da Alemanha seu lar. Mas mesmo assim, os sinti da Alemanha não estavam qualificados para o status de Volksgruppe, como outros grupos minoritários, os daneses e os sórbios, por exemplo. Então, quando é que um estrangeiro se torna nativo? A Constituição norte-americana definia originalmente os descendentes de escravos africanos como três quintos humanos; e hoje a palavra nativo ainda é utilizada erroneamente nos Estados Unidos para designar um indígena, e não apenas alguém que tem seus direitos de nascimento. Os sinti jamais seriam considerados nativos (a não ser no sentido de "primitivos"), muito menos alemães. Mas podem os donos da terra, que partilham fronteiras com oito países diferentes, de fato defender a existência do teutônico puro, a não ser no laboratório de algum Frankenstein? Claro que não. A idéia do alemão purosangue está no cerne da identidade germânica e gera, por extensão, os valores culturais considerados inerentes à raça. Os ciganos romenos estariam familiarizados com essa linha de pensamento, depois de anos ouvindo a retórica de Ceausescu sobre os dácios, os proto-romenos "puros". Todos os cidadãos do antigo bloco socialista compartilham - ou, se fazem parte de minorias, sofrem - esse sonho de um estado unirracial; a Alemanha serve de modelo. O ideal sentimental do Volk é muito ativo na imagem que a Alemanha faz de si mesma. O mito do Volk surgiu como reação à glorificação do indivíduo inventada pelos franceses e forneceu uma ideologia unificadora para a população muito dispersa, em particular nos territórios orientais. A intelligentsia romântica alemã, provavelmente sentada nos salões desses mesmos schlosses no começo do século XIX, formulou o conceito de Volk - sintetizado na imagem do alemão arquetípico, ainda presente em imagens que ilustram embalagens de produtos por toda parte: loiro, saudável, arrumado e ativo. Basta olhar a figura de qualquer Heidi num pacote de bolachas alemãs para entender esse ideal: bem-estar interior - revelado pelas faces rosadas e brilhantes cabelos loiros - conseguido por meio de uma alegre e industriosa fidelidade (ou submissão) ao Volk. Essa história de Volk dá uma boa pista do especial desprezo votado aos ciganos, entre os muitos estrangeiros desprezados, na Alemanha. Em primeiro lugar, eles parecem ser o oposto do Volk alemão: sujos, escuros, dissimulados, indolentes e agressivamente anti-sociais. E, no entanto, de maneira mais sutil, essa gente é que de fato constitui um Volk. Fecham-se em si mesmos e mantêm seus costumes, sua língua e a união da comunidade, ela própria sempre prezada acima do individual. Ao menos entre os seus, os ciganos são verdadeiramente comunitários de uma maneira que os alemães só podem imaginar. Os alemães ofereceram cidadania aos estrangeiros de "etnia" alemã como recompensa por haverem, pretensamente, se recusado a adotar os usos e costumes pagãos (eslavos) ao longo de sua centenária permanência no Leste; e ali, bem na frente de seus jardins, estava um grupo que não havia - e nunca haveria - de se assimilar.
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Adquiri este livro durante a Bienal do Rio de Janeiro, em maio de 2005.
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