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Autor: José Murilo de Carvalho
Editora: Civilização Brasileira
Traduzido por: Livro Editado em Português do Brasil
Páginas: 236
Ano de edição: 2011
Peso: 290 g
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O subtítulo do livro do Mestre José Murilo Carvalho, é a síntese da cidadania no Brasil, ou seja: um longo caminho. Como bem disse o autor, foi após a abertura política da malfadada ditadura militar 1964-1985 que a questão da cidadania passou ao primeiro plano na imprensa, na justiça, nas universidades, nos governos e nas ruas. Tanto é que Ulisses Guimarães, ao proclamá-la em 5 de outubro de 1988 a chamou de Constituição Cidadã. Longo é, foi e ainda será o caminho da cidadania, talvez porque nem saibamos quem estava ou está menos preparado para exercê-la, o homem comum, os governos, os políticos ou as elites. Convive-se até hoje, na rotina do dia-a-dia com o desrespeito aos direitos do cidadão, que não são efetivos de fato, bastando olhar as intermináveis filas nos hospitais e postos de saúde, a centenária morosidade da justiça, o descaso da polícia, a insegurança pessoal em todos os lugares públicos ou privados, o desatino do transporte publico coletivo, a inqualificável escola publica, a miserabilidade de parte significativa da população que mora precariamente e não tem o que comer, e por aí vai... Para tudo se faz um longo discurso e se cria uma lei. Fazemos assim desde há muito, como em 1827, para cumprir a exigência de proibição do tráfico de escravos, feita pela Inglaterra, que seria uma condição para o reconhecimento da independência do Brasil. Imediatamente se fez uma lei em 1831 que não teve nenhum efeito prático. Daí uma de nossas primeiras piadas: “a lei para inglês ver”. O Brasil foi o último país do mundo ocidental e cristão a extinguir a escravidão em 1888. Padre, bispo, freira todos tinham escravos. Se a cidadania é exercício de direitos, nós ainda somos cidadãos de segunda classe.
A cidadania se caracteriza pela obtenção de três direitos bem distintos: civis, políticos e sociais ensina o autor. “Direitos civis são os direitos fundamentais à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei. São eles que garantem as relações civilizadas entre as pessoas e a própria existência da sociedade civil surgida com o desenvolvimento do capitalismo. É possível haver direitos civis sem direitos políticos.” Os direitos políticos referem-se à participação política do cidadão. “Em geral, quando se fala em direitos políticos, é do direito do voto que se está falando” Porém, não é possível haver direitos políticos sem direitos civis. Os direitos sociais referem-se à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, à aposentadoria. Estes permitem reduzir o excesso de desigualdade econômica gerado pelo capitalismo.
O livro é imperdível em qualquer dos quatro capítulos:
1. “Primeiros Passos”, que vai de 1822 até o golpe getulista de1930.
2. “Marcha Acelerada”, que inicia em 1930 e deságua em 1964, que foi o ano da vingança dos tenentes que tinham perdido o jogo do poder para Getulio Vargas, 34 anos atrás.
3. “Passo Atrás, Passo Adiante”, capítulo que relata o período nefasto que vai de 1964 a 1985, quando os militares tinham a cara de pau de chamar de Revolução Redentora..
4. O último capítulo trata da “Cidadania, Após a Redemocratização em 1985”.
Ainda praticamos a política do privilégio em detrimento dos direitos, até mesmo a nossa legislação trabalhista é um vetusto entulho imposto durante a ditadura de Getulio Vargas, uma verdadeira cópia da Carta de Lavoro ,do facista Mussolini que a utilizou de 1922 até 1945.
Ainda somos usuários do populismo, clientelismo, patrimonialismo, da demagogia e corrupção política e empresarial.
Cidadania no Brasil é isso. É livro sensacional, bom de ser lido, fácil de ser entendido.José Murilo de Carvalho é o fodão, como disse o blog “Na pratica a Teoria é Outra” http://napraticaateoriaeoutra.org/?p=6784, que está transcrito no “saiu da mídia”
A historia do longo processo de cidadania brasileira, na visão do Ph.D José Murilo de Carvalho, centrada nos direitos civis, sociais e políticos que começa com a Independência em 1822, e termina no final dos anos FHC em 2002. São 180 anos de obstáculos para a vivência plena e absoluta da cidadania,
Direitos Civis Retardatários.
Autor: Blog Na Pratica a Teoria É Outra
Veículo: Blog http://napraticaateoriaeoutra.org/?p=6784
Fonte: http://napraticaateoriaeoutra.org/?p=6784 22/8/2010
O sempre alerta Sérgio Lamucci, do Valor mandou bem entrevistando o José Murilo de Carvalho, famoso historiador e fodão, na edição de ontem. O José Murilo é autor de um dos livros que mais faziam sucesso quando eu estava na faculdade, Os Bestializados, mas eu gosto mesmo é do Teatro das Sombras, sobre a política nos tempos do Império (o brasileiro, não esse aí do Negri, nem o do Guerra nas Estrelas), um dos melhores livros de história que eu já li. É, sem dúvida, um dos grandes intelectuais brasileiros.
Realmente recomendo a leitura. Deixando de lado as coisas com as quais eu obviamente concordo, e as coisas com as quais eu obviamente discordo, vamos discutir coisas bacanas.
Começando com boa pergunta, boa resposta:
Valor: Como ocorre desde 1994, a eleição está polarizada entre PT e PSDB, os partidos que, segundo disse uma vez Fernando Henrique Cardoso, disputam ” quem é que comanda o atraso ” . Esse arranjo político tem sido benéfico para o país?
Carvalho: A frase é justa. Tanto Fernando Henrique quanto Lula pagaram o preço de suas alianças com o atraso. Isso foi cobrado de Fernando Henrique, agora é cobrado de Lula. Por mais que essas alianças frustrem e irritem os que sonham com uma democracia moderna, sem elas, em nossas circunstâncias, não teria havido a estabilidade necessária para o exercício do governo dentro de um sistema representativo. Os impasses entre o Executivo e o Legislativo teriam causado paralisia do governo, pois, como já percebera Celso Furtado, entre nós o Executivo tende a ser mais reformista do que o Congresso. É verdade que essas alianças têm causado grandes danos à República. Está aí o exemplo do mensalão. Mas é preferível lutar contra a corrupção dentro da liberdade do que nem poder detectá-la em regime de exceção.
É isso aí. Tem que pensar nas duas coisas ao mesmo tempo: não se pode simplesmente ignorar a necessidade de conquistar apoio parlamentar, mas não se pode minimizar o estrago à nossa cultura política que as alianças com corruptos proporcionam. Eu acho que precisávamos de mais reflexão a esse respeito, à direita e à esquerda. Uma consequência disso seria que poderíamos parar e, bipartidariamente, bolar algum arranjo institucional que diminua a corrupção. Outra, como vimos em nesse texto aqui, que os partidos parariam de fazer campanha só dizendo que o outro é corrupto, e começariam a ter que mostrar propostas.
E agora vamos encarar de frente o problema, como será um governo em aliança com o PMDB, sem Lula:
Valor: O PMDB ganhou força ao longo do governo Lula. Para ter o apoio do partido à Dilma, Lula fez o PT apoiar o PMDB em Minas e no Maranhão. Esse avanço do PMDB é preocupante?
Carvalho: Como disse, essas alianças, apesar de constrangedoras, são indispensáveis para a governança. O que preocupa é a natureza da convivência do PT com o PMDB em eventual governo Dilma. Pela força de sua liderança, Lula foi capaz de enquadrar o PT e controlar o PMDB. Dilma terá maior dificuldade em fazer isso. Ela poderá se ver diante do dilema de ter que recorrer à ajuda de Lula, enfraquecendo a própria autoridade, ou enfrentar crises desgastantes em sua aliança.
Não há como negar o risco do PMDB encarar essa chegada ao poder como um passe livre para fazer a festa. Mas há outras possibilidades. Eu acho que o PMDB está cavando já sua nova identidade, a de ser o moderador do PT. Se o PMDB virar isso, e deixar de ser um partido forte mas irresponsável, só por isso já vai ter valido a pena o governo Dilma. Note-se que, agora, ao contrário dos períodos anteriores, o PMDB vai estar na frente, exposto a críticas por ser governo, como o PFL estava durante o governo FHC. Vai ser interessante saber se o PMDB vai saber se renovar como o PFL não soube.
Aqui está uma coisa para manter em mente:
Valor: O Brasil ganhou peso no cenário internacional nos últimos anos, tornando-se uma economia com potencial de crescimento forte num momento em que os países desenvolvidos lutam para sair da crise, beneficiado ainda pela descoberta das reservas de petróleo no pré-sal. O país está sabendo aproveitar esse momento? Pode ir além da vocação de potência regional?
Carvalho: É um momento certamente positivo. Mas, há riscos. Tendemos a oscilar entre os complexos de vira-lata e o oba-oba, ambos funestos. Receio que estejamos caindo no segundo complexo. Os indicadores são bons e auspiciosos, mas há um imenso trabalho a ser feito e os resultados não são garantidos. O país está caindo na participação no comércio internacional, depende muito de commodities, tem grandes desvantagens devidas à má qualidade da educação, à falta de qualificação da mão de obra, ao excesso de burocracia (como é possível que seja quatro vezes mais barato criar uma empresa na China?), à baixa taxa de investimento. O petróleo como fonte de energia está sob forte suspeita, tendo em vista os riscos que cria ao meio ambiente tragicamente demonstrados no vazamento do Golfo do México. Diria que, mais que o petróleo, o combustível mais importante para que as promessas não se frustrem é o suor do trabalho.
Pois é, a gente comemora que a misérie extrema caiu pela metade, e tem que comemorar, mesmo, mas, porra, ainda tem miséria extrema? O JMdC dá aí em cima uma lista muito boa de problemas a serem enfrentados. Entreguem essa entrevista para a Dilma.
E dois momentos interessantes pelo cara ser historiador. O primeiro:
Valor: O que explica esse conservadorismo num país tão desigual?
Carvalho: A Independência não tocou na estrutura social do país, a abolição se fez sem guerras, a República só mudou a escolha do chefe de Estado e fortaleceu as oligarquias regionais, a Revolução de 1930 nada teve de revolução, a Revolução de 1964 foi uma contra-revolução, 1985 foi uma negociação. A razão para isso é que o povo político no Brasil nunca teve capacidade revolucionária em nível nacional e só começou a ganhar força eleitoral a partir de 1945. Até hoje ele ainda é vulnerável a políticas de cooptação. Pela capacidade de coerção ou cooptação, temos as elites mais competentes do mundo, inclusive a que está no poder hoje.
A competência das nossas elites é mesmo impressionante, mas: em geral, no intervalo entre essas conciliações, teve muita briga (se teve contra-revolução, é porque alguma agitação estava tendo, ainda que não propriamente uma revolução; antes de 30 já tinha muito anarquista fazendo greve por aí, e por aí vai). E talvez cabesse mais ênfase na mudança desde 1945.
E, finalmente:
Valor: O governo Lula está entre os melhores que o Brasil já teve ou ainda é cedo para o julgamento?
Carvalho: Ainda falta a distância necessária para colocar seu governo em perspectiva histórica. Para ficar só na República, Lula terá que competir com o quase imbatível Getúlio Vargas e suas leis sociais e trabalhistas, com JK e seu desenvolvimentismo democrático, e com o próprio Fernando Henrique Cardoso e sua estabilização da economia, enxugamento do Estado e reinício das políticas sociais. Pode-se dizer, no entanto, que Lula seguramente estará nesse time.
Pessoalmente, o que não sei é se JK e Vargas merecem estar nesse time. Mas isso sou eu (e, suspeito, só eu). Leiam aí a entrevista, é sempre bacana ver sujeito inteligente pensando.
PS: estava pensando aqui, como é dura a vida do cara que edita caderno cultural no Brasil atual. O Valor já entrevistou, recentemente, o Alencastro, o Fausto, e agora o Zé Murilo. Não falta muita gente pra entrevistar no estilo “não apenas academicamente brilhante, mas tem algo a dizer sobre as grandes questões”, falta? O Giannotti, eu acho. O FHC depois de umas cachaças que o façam esquecer que foi presidente e o façam falar o que realmente acha sobre as coisas. O Weffort quando resolver interromper seus 16 anos de criogenia. Mais alguns críticos literários, alguns economistas. Contando que não dá pra repetir o mesmo cara toda hora, e que tem vezes em que eles não vão querer dar entrevista, de vez em quando deve ser difícil editar esses negócios. É capaz de chegar, daqui a alguns anos, uma nova leva de sujeitos feras, que, por enquanto, ainda estão no estágio “só academicamente brilhantes”, mas está demorando
Rafael me presenteou no dia dos pais, e assinou em 14/8/2011 que “papai lê pra caralho”.
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