Marcio Mafra
02/08/2020 às 18:43
Brasília - DF
A diversidade feminista é a fonte e o efeito do caráter mais profundo do que chamamos genericamente de feminismo. O feminismo surge como contraposição
ao sistema, mas também como promessa. Contra uma visão de mundo pronta, o feminismo é como a dialética negativa, que visa à superação de um estado social injusto
e que não teme desaparecer depois que tenha cumprido sua função histórico-social
Apesar disso, o feminismo é método, no sentido de caminho que se faz ao caminhar, sem garantia alguma de que se chegará ao destino desejado. Por seu caráter
aberto, ele incomoda muita gente. O patriarcado precisa se proteger do feminismo como o diabo da cruz - para usar uma expressão própria desse campo expressivo-
-conceitual que é o patriarcado, um regime eminente-, mente religioso, moralista e ascético em relação ao qual o feminismo parece ser de um paganismo que amedronta.
Quem tenta destruir o feminismo é justamente quem tem medo do seu caráter transformador. Pelo menos em um primeiro momento. Porque pode parecer altamente
negativo em relação ao estabelecido, e também positivo, como é evidente, quando se tem em vista esse caráter processual do feminismo. Veja que aqui uso os termos
"negativo» e "positivo" para além de um sentido moral o feminismo cresce em todos os espaços sociais.
Grupos e coletivos enriquecem o cenário da luta pelos direitos das mulheres e, como não pode deixar de ser, de todas as minorias das quais o signo anteriormente opressivo
"Mulher" é urna expressão básica, um signo de luta. Raça e classe social, desde o surgimento do feminismo interseccional, são questões que vêm contribuir com o avanço
das práticas feministas historicamente ligadas a gênero e sexualidade. Nunca é demais dizer que o impacto do feminismo interseccional é tal entre nós que podemos falar dele corno um divisor de águas.
Podemos falar também da pluralidade de propostas e posturas no âmbito feminista que incluem mulheres de todas as idades, raças, crenças, plasticidades, escolaridades,
sexualidades.
A dialogicidade do feminismo refere-se a essa presença concreta das diferenças. O feminismo é um espaço-tempo, no qual habitam a multiplicidade dos corpos em relação não violenta. Nesse sentido, o dissenso
é urna característica da dialogicidade, desse não discurso ou contradiscurso, quer dizer, desse desejo de diálogo ou dessa crítica consistente, dessa multiplicidade de vozes,
dessa presença de dissonâncias em ação performativa sincronizada, a saber, aquela que nos define corno seres expressivos e inventores de mundos ao mesmo tempo.
Diálogo é um movimento entre presenças que diferem entre si. O feminismo é, nesse sentido, uma utopia concreta, em que o enlace entre política e ética orienta-se
em defesa da singularidade das pessoas. O feminismo é a própria democracia que queremos, mas uma democracia profunda, que começa colocando a questão dos direitos
das mulheres e avança, interrogando a urgência dos direitos de todos que sofrem sob jugos diversos, em cenários nos quais o poder do capital estabelece toda forma de
violência, das mais sutis às mais brutais.